Perícia Trabalhista: a importância da avaliação in loco

Perícia Trabalhista: a importância da avaliação in loco

Dr. Antonio Carlos Vendrame

26 de março de 2024

A perícia, como matéria de fato, depende essencialmente de um fato para que possa ser realizada. Se o fato não mais existir, não há como realizar a perícia, por perda de objeto.

Assim, a perícia se incumbe de observar um fato e retratá-lo em forma de laudo, colocando ao final sua opinião técnica.

 

Perícia trabalhista de insalubridade e periculosidade

No entanto, temos notado uma condição isolada que está cada vez mais se repetindo na Justiça do Trabalho, a realização de perícia trabalhista de insalubridade e periculosidade nas dependências do Fórum Trabalhista.

Juízes trabalhistas determinam que os Peritos Judiciais realizem as perícias de insalubridade e periculosidade, sem efetivamente visualizar o local de trabalho do reclamante.

Ora, é essencial que a perícia trabalhista vistorie o local de trabalho do reclamante, para colher elementos de convencimento à conclusão pericial. É impossível exclusivamente a partir dos relatos das partes idealizar o ambiente de trabalho com todas as suas peculiaridades.

É preciso salientar que as narrativas das partes, que são leigas, não servem como indicativos à perícia.

Sempre pergunto aos médicos se é possível fazer perícia num falecido e, a resposta é: na melhor das hipóteses, só é possível fazer uma necropsia, mas perícia médica não é possível.

No entanto, os engenheiros são compelidos a fazer perícias em locais onde nunca pisaram.

 

Perícia trabalhista sem avaliar o local de trabalho

Aprofundando a questão, não há como validar uma perícia realizada no saguão do Fórum Trabalhista, visto a falta de avaliações qualitativas e quantitativas do ambiente laboral do reclamante.

Como será possível afirmar que o reclamante esteve exposto a este ou aquele agente, em intensidade ou concentração acima dos limites de tolerância?

Por mais esforço que as testemunhas façam, é impossível estimar a exposição que sofria o autor em seu ambiente de trabalho.

 

Avaliação quantitativa

No caso dos agentes avaliados de forma quantitativa, tais como exposição a ruídos, calor, radiações ionizantes, vibrações ou agentes químicos, como fará a perícia trabalhista para avaliar tais agentes à distância?

Assim, por si só, o reclamante ficaria privado da avaliação de tais agentes, podendo ter o resultado de sua perícia prejudicado.

 

Avaliação qualitativa

Para os agentes avaliados de forma qualitativa, a exemplo das radiações não ionizantes, frio, umidade, agentes químicos e agentes biológicos, a situação não é muito diferente.

E, ainda que não seja obrigatória sua mensuração, a avaliação qualitativa não é um cheque em branco dado na mão do Perito que caracterize como insalubre qualquer situação, mas tão somente aquela, cuja natureza e intensidade do agente e tempo de exposição culminem em exposição nociva ao empregado, nos termos do art. 189 da CLT.

 

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Problemas da periculosidade caracterizada à distância

A periculosidade caracterizada à distância também poderia gerar inúmeros questionamentos, a exemplo de: a cabine primária possuía ou não todos os requisitos de segurança? Os inflamáveis existentes estavam ou não em condições de risco acentuado? Qual tipo e quantidades de explosivos havia no paiol?

Assim, seja insalubridade, seja periculosidade, impossível é a manifestação da perícia sobre a existência, ou não, de enquadramento para o caso concreto sem a observação in loco do local de trabalho.

Desta forma, com observância à qualidade pericial, não é possível a realização de perícias no saguão do Fórum Trabalhista ou ainda que seja numa confortável sala, pela impossibilidade material de avaliação do local de trabalho do reclamante.

Recentemente foi invalidada perícia realizada em data na qual não se refletia a condição real de trabalho do reclamante (PJE 0000251-31.2017.5.12.0012). 

 

A perícia deve ser realizada em condições reais de trabalho

A perícia trabalhista deve ser realizada em condições reais de trabalho daquelas enfrentadas pelo reclamante.

Claro que num período de crise, como está passando o país neste momento, grande parte das empresas está com o movimento reduzido ou sem qualquer atividade e, nessa situação, não há como realizar uma perícia.

O ideal é que se respeite inclusive o horário de trabalho do reclamante. Assim, não é possível a realização de uma perícia de um vigia noturno, durante o dia.

 

Alguns exemplos

Já enfrentamos situação análoga onde o reclamante era motorista de ônibus de empresa de transporte urbano de passageiros. Durante os trabalhos periciais, o reclamante postulava que as avaliações de ruído e vibrações fossem realizadas no mesmo veículo em que laborou ou em veículo do mesmo modelo e ano.

As empresas de transporte substituem sua frota a cada cinco anos e, na data da perícia, já não haveria veículos do modelo e ano conduzidos pelo autor. Retornamos em juízo e devolvemos os autos por perda de objeto.

Há ainda outra situação bastante discutível em termos de perícia trabalhista. Como realizar a perícia num ambiente que se encontra descaracterizado?

Um ambiente laboral pode se descaracterizar pelo encerramento de atividades da empresa, por transferência ou mudança de local, pela modificação total ou parcial do ambiente, pela terceirização da atividade, etc.

A situação é bem parecida com a anterior e vale citar o primeiro parágrafo deste artigo: Se o fato não existir mais, não há como realizar a perícia, por perda de objeto.

Infelizmente a perícia trabalhista não tem como utilizar o “túnel do tempo” para voltar ao passado e vistoriar aquele ambiente que não existe mais.

Um exemplo clássico é a realização de uma perícia de um profissional da construção civil, em obra que já tenha finalizado. Tecnicamente não há o que fazer e tentar realizar a perícia por analogia ou de forma indireta, sempre estará vulnerável à veemente impugnação das partes.

Através da OJ 278, o TST determina que: OJ-SDI1-278 ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PERÍCIA. LOCAL DE TRABALHO DESATIVADO (DJ 11.08.2003). A realização de perícia é obrigatória para a verificação de insalubridade. Quando não for possível sua realização, como em caso de fechamento da empresa, poderá o julgador utilizar-se de outros meios de prova.

 

Em caso de impossibilidade da produção da prova pericial

Assim, no caso da impossibilidade da produção da prova pericial, poderá o Juiz se utilizar da prova documental, testemunhal ou mesmo confissão para formar sua convicção.

No entanto, tal faculdade é apenas do Magistrado, não cabendo ao Perito, por sua conta e risco, buscar outras provas e, por meio destas, compor uma prova pericial. 

Ademais, por força do art. 472 do CPC, o juiz poderá dispensar prova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem, sobre as questões de fato, pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes.

E, novamente, fica patente que a dispensa de prova pericial e utilização de prova emprestada é exclusiva do Juiz e não do Perito Judicial.

Finalmente, considerando que à perícia cabe opinar tecnicamente quanto à matéria de  fato, deve o Perito Judicial se abster de realizar perícia nas situações em que não houver fato a ser observado.

Podendo realizar a “perícia indireta” somente mediante a determinação judicial e, ainda assim, tendo a máxima cautela em não se desviar de sua posição técnica. Dispensável lembrar que o §1º do art. 464 do CPC dispõe que o Juiz indeferirá a perícia quando a verificação for impraticável.

Quer saber mais ou ficou com dúvidas sobre a perícia trabalhista? Entre em contato conosco. Será uma satisfação ajudar!